Juliano Moreira (Salvador, 6 de janeiro de 1872 - Petrópolis, 2 de maio de 1933) foi um psiquiatra brasileiro que, no início do século XX, promoveu o melhor conhecimento científico da psiquiatria brasileira. Ele fez contribuições únicas à ciência e à sociedade brasileiras, tanto em termos pessoais quanto vida profissional, e merece o reconhecimento de quem opor-se ao racismo e lutar pela educação como base de um mundo melhor.
Nasceu quando a escravidão ainda vigorava no Brasil, sua mãe, Galdina Joaquina do Amaral, era escrava da residência do Luís Adriano Alves de Lima Gordilho, Barão de Itapuã. Quando Juliano tinha 13 anos, sua mãe morreu e ele foi apontado como excepcional por Manoel do Carmo Moreira Junior, inspetor de iluminação pública português. Graças ao apoio do Barão de Itapuã, que reconheceu a inteligência e a promessa do jovem, Moreira soube se preparar e se matricular na Escola Bahia da Medicina em 1886, dois anos antes da abolição da escravidão. Ele se formou em 1891 aos 19 anos, escrevendo seu tese sobre sífilis precoce.1 Em 1896, ele competiu por uma posição de professor substituto na área de doenças nervosas e mentais departamento e foi contratado após receber uma pontuação perfeita. Destaque da dermatologia, foi o primeiro pesquisador para identificar leishmaniose tegumentar e procurou provar que não havia fator racial na doença.
Em 1903, após trabalhar em uma clínica psiquiátrica na Bahia, ele mudou-se para o Rio de Janeiro, onde entre 1903 e 1930 ele dirigiu o Hospício Nacional de Alienados e, embora não tenha feito faculdade do Rio de Janeiro Escola de Medicina, ele ensinou estagiários de psiquiatria. Dele os alunos seguiram para uma variedade de especialidades médicas, como como neurologia, psiquiatria, medicina interna e forense psiquiatria. Durante sua gestão no Hospício Nacional de Alienados, humanizou o tratamento, encerrando o confinamento do paciente. Em 1905, ao lado de Afrânio Peixoto e outros colegas, fundou os Arquivos Brasileiros de Psiquiatria, Neurologia, Ciências e Afins (Arquivos Brasileiros de Psiquiatria, Neurologia e Ciências Relacionadas). No ano seguinte, ele instalou uma seção de laboratório no hospício, realizando as primeiras punções lombares e exames citológicos do líquido cefalorraquidiano para fins diagnósticos em casos de sífilis espinhal (tabes dorsalis), paralítico demência, sífilis cerebral e várias formas de meningite. Ele criou um asilo judicial, o primeiro no Novo Mundo.
Em suma, Moreira revolucionou os conceitos psiquiátricos e métodos no Brasil, especialmente no que diz respeito ao atendimento de pessoas com transtornos mentais. Seu legado inclui o desenvolvimento de novos modelos de atendimento psiquiátrico, incluindo um lei que prevê assistência aos doentes mentais, que passou em 22 de dezembro de 1903. Ele lutou contra o racismo científico, refutando a suposição de que as doenças mentais estão ligadas com cor de pele.
Antes de Moreira, o modelo psiquiátrico francês tinha foi adotado em massa no Brasil sem considerar diferenças culturais. No entanto, Moreira abraçou o modelo alemão, incluindo muitas das ideias de Kraepelin sobre classificação e psiquiatria transcultural, que deu início a uma renovação teórica das ideias psiquiátricas brasileiras. Ele se propôs a criar um modelo de atenção mais humanista que foi mais bem adaptado às características culturais do Brasil no início do século XX. Ele removeu as barras das janelas das enfermarias, camisas de força abolidas, e criou o Pavilhão Seabra, um grande edifício para treinamento vocacional paciente em ferraria, combate a incêndios, mecânica elétrica, carpintaria, marcenaria, tipografia e encadernação, fabricação de calçados, roupas de cama e vassouras, e pintura. Lá, os pacientes realizavam atividades que ajudou em sua recuperação e trouxe alguma renda. Moreira começou a transmitir música nos corredores como um forma de terapia e transformou o hospício em um centro cultural instituição, trazendo professores e cientistas e definindo oficinas artísticas em antecipação à terapia ocupacional. Por exemplo, Albert Einstein visitou o Brasil em 1925 (Figura 1) e, após um discurso na Academia Brasileira de Ciências, quebrou o protocolo e aceitou o convite de Moreira para o Hospício Nacional de Alienados onde ele ficou encantado com o curso workshops terapêuticos para pacientes psiquiátricos.
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Figura 1 - Einstein Visita o Brasil |
Juliano Moreira foi o primeiro psiquiatra brasileiro a receber reconhecimento internacional. Ele era fluente em francês, Alemão, Espanhol, Português e Inglês (este último falado com a facilidade de um inglês polido da classe alta) e participou de muitos congressos médicos, representando o Brasil no exterior em várias ocasiões. De 1895 a 1902, ele ministrou cursos e supervisionou estágios de doenças, visitando muitas instalações psiquiátricas em Alemanha, Inglaterra, França, Itália e Escócia. Ele representou o Brasil em congresso internacional em Paris (1904) e foi eleito Presidente Honorário da 4ª Congresso Internacional de Assistência ao Insano. Ele também foi delegado brasileiro em congressos em Lisboa (1906), Milão (1907), Amsterdã (1907), Londres (1913) e Bruxelas (1913).
No exterior, ele também foi obrigado a buscar especialistas e clínicas para sua tuberculose. Em um sanatório no Cairo, ele conheceu Augusta Peick, uma enfermeira alemã de Hamburgo. Os dois se casaram no início de 1910 e voltaram ao Brasil juntos.
Moreira foi eleito membro titular do Nacional Academia de Medicina do Brasil em 1903 (o patrono da cadeira 57). Ele foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Ciências e foi seu presidente de 1926 a 1929. Devido por suas visões éticas e morais, seu trabalho incansável e multidisciplinaridade, ele foi eleito para uma série de organizações, incluindo a Sociedade Médico-Legal de Nova York, a Sociedad de Neurologıa y Psiquiatria de Buenos Aires, a Anthropologische Gesellschaft de Munique; a Société de Médicine de Paris, a Société de Pathologie Exotique, a Sociéte Clinique de France, a Société Clinique de Medicine Mentale, National Defense League, the Mental Hygiene League, the American Academy of Political and Social Science, a Société Medico Psychologique de Paris, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, a Academia de Letras da Bahia, e Instituto Brasileiro de Ciências. Em julho de 1928, ele começou uma longa jornada para o Extremo Oriente, incluindo paradas em Tóquio, Kyoto, Sendai, Hokkaido, Osaka e Funoko, recebendo a Ordem do Tesouro Sagrado do Imperador do Japão como um ‘‘ Contribuidor da Ciência Mundial’’. Isso se deveu em parte à sua luta contra o preconceito e discriminação, que também estava sendo dirigida aos imigrantes sino-japoneses no Brasil, que eram referidos como o ‘‘ Perigo Amarelo ’’ .
Juliano Moreira defendeu a ideia de que a doença mental originado de fatores físicos e situacionais, como higiene precária e falta de acesso à educação. Isso contradiz o pensamento racista atualmente em voga no mercado nacional academia, que atribuiu problemas psicológicos em Brasil à miscigenação. Um aspecto importante de sua trabalho estava combatendo a ideia de que a miscigenação racial estava levando à degeneração da população brasileira. Ele argumentou que a doença mental foi causada por fatores como alcoolismo, sífilis, parasitas e problemas de saúde e condições educacionais. Além de ampliar o âmbito da psiquiatria brasileira, ele iniciou uma nova abordagem para o tratamento de doenças mentais.
A vida deste notável psiquiatra, cientista e humanista foi descrito em várias publicações, e sua carreira foi muito maior do que este breve resumo pode recontar. Morreu a 2 de maio de 1933, nos Correias Sanatório em Petrópolis, onde foi internado por tratamento da tuberculose. Ele não deixou filhos.
Fonte: Artigo da Revista Brasileira de Psiquiatria
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